Em São Paulo, há a empresa de autocarros Benfica, fundada por três portugueses de Viseu em 1955. Em 58 anos de história, só uma queixa: dos juniores do FC Porto
O mais engraçado daqueles inquéritos de Verão às “personalidades” nacionais é a resposta à pergunta “qual é o seu maior defeito?” Há de tudo, mas nada, nada mesmo, que belisque a integridade deste ou daquele inquirido. Isso é que era bom. Vai daí, o defeito mais frequente dos portugueses é o teimoso. Espelho meu, espelho meu, diz-me quem é mais teimoso que eu? Não há. Por isso, voltámos a São Paulo, ao tal hotel no Centrão, o do quarto sem janelas, a um quarteirão da cracolândia.
Crac? Pelé, Garrincha, Zico, Sócrates, Romário, Ronaldo, Ronaldinho e por aí fora. Lândia? Soa a diversão ilimitada como a Disneylândia. Vai ser bonito, vai. Uma volta ao quarteirão e decepção grande, enorme, gigantesca. Afinal, a cracolândia é de crack. Local de peregrinação do piorio, é também conhecido como a Boca do Lixo, berço do cinema marginal, demasiado condimentado com cenas de teor sexual explícito, denominada a fase da pornochachada, e responsável por mais de 700 títulos.
A cracolândia é barra pesada. Em Janeiro do ano passado, a Polícia Militar inicia a operação Centro Legal, de combate ao tráfico de drogas. Nesse período, 155 pessoas são encaminhadas para instituições de recuperação, 191 são presas em delito flagrante e apreendem-se 63 toneladas de droga, a maioria crack. Lá está, cracolândia. A viagem matinal por esse mundo proporciona uma visão inaudita. Vira-se uma esquina, tropeça-se no chão irregular e ouve-se um estrondo. É um autocarro a acelerar. Vai para onde? Ninguém sabe, lá em cima só diz reservado (ai quando o Marquês de Pombal souber). Poderia ser um bairro, sim, aqui em São Paulo há até um chamado Roland Garros, mas não é. Reservado é reservado, um autocarro vazio a caminho da garagem. Mas não é um autocarro qualquer, é da empresa Benfica, com o símbolo da águia em tamanho XXL e até o slogan em latim “e pluribus unum”. Scary movie.
Uma rápida conversa aqui, ali e chega-se à conclusão que o slogan está ligeiramente distorcido. O Benfica é que é uma nação? No Brasil, com o Oceano Atlântico a separar-nos, há uma empresa chamada Benfica. Vamos então de metro até Barueri, onde está a garagem principal. À nossa espera, Marcos Paulo Freitas Carreira, consultor de marketing e neto de um dos três fundadores portugueses. A história contada na primeira pessoa. “O meu avô Arnaldo de Figueiredo Freitas chegou ao Brasil na década de 50. Com ele, vieram também os seus irmãos Manuel e Filipe. Os três vinham da aldeia Alvarelhos, Carregal do Sal, no distrito de Viseu. Antes de se lançarem no sector de transportes de passageiros, onde encontrariam muito sucesso ao longo dos anos, tiveram a oportunidade de conhecer bem de perto a vida nas estradas brasileiras, a fazer entregas de doces de camião no estado de São Paulo.”
Pausa para ver uma frota de autocarros, mas somos teimosos e queremos saber mais. “Quando eles decidiram investir no sector de transporte de passageiros, há mais de 50 anos, criaram a empresa Benfica. A escolha desse nome está única e exclusivamente associada ao Sport Lisboa e Benfica, equipa do coração do meu avô e seus dois irmãos – um deles até foi juvenil do clube nos anos 40. Por coincidência, veja lá como as coisas são, o Benfica estava em São Paulo na altura em que a minha família registou a empresa, em São Caetano do Sul, São Paulo. Ao longo dos anos, a empresa não parou de crescer. Hoje em dia, o Grupo Benfica possui cinco empresas de transportes espalhadas pelo Brasil (TT Benfica, Benfica BBTT, Ralip, Noiva do Mar e Benfica Cargas e Logística), com garagens em diversas cidades brasileiras, uma frota de mais de 1500 veículos e cerca de 3500 empregados.”
Pausa (mais uma), para tocar nas fotografias antigas, maravilha. “O meu avô Arnaldo faleceu em 2000 mas deixou um legado enorme, através do seu filho, do seu neto e eu vou encarregar-me de espalhar a palavra por mais umas gerações.” E eles eram de ir a Portugal? “Nossa, sempre. Iam passar as férias de Verão e tinham de ver o Benfica. Eu apanhei esse ‘bicho’ e fui à Luz ver o Benfica-Arsenal para a Copa Eusébio em Agosto de 2012. Aqui no Brasil, somos todos da Portuguesa. Só pode, né?”.
Estamos quase quase a acabar, só mais uma pergunta: o autocarro do Benfica nunca deu problemas? (estamos a pensar em avarias, acidentes e assim, mas a resposta é surpreendente). “Olha, há uns anos, uma equipa de juniores do FC Porto veio cá a São Paulo para jogar um torneio e recusaram-se a entrar quando viram o autocarro do Benfica, à espera deles no aeroporto. Foi um caso até engraçado, claro que não ficámos desanimados, cada um tem o direito de andar onde quer. Aqui no Benfica, somos campeões do conforto.” Disto isto, voltamos à cracolândia. Lar, doce lar.
Crac? Pelé, Garrincha, Zico, Sócrates, Romário, Ronaldo, Ronaldinho e por aí fora. Lândia? Soa a diversão ilimitada como a Disneylândia. Vai ser bonito, vai. Uma volta ao quarteirão e decepção grande, enorme, gigantesca. Afinal, a cracolândia é de crack. Local de peregrinação do piorio, é também conhecido como a Boca do Lixo, berço do cinema marginal, demasiado condimentado com cenas de teor sexual explícito, denominada a fase da pornochachada, e responsável por mais de 700 títulos.
A cracolândia é barra pesada. Em Janeiro do ano passado, a Polícia Militar inicia a operação Centro Legal, de combate ao tráfico de drogas. Nesse período, 155 pessoas são encaminhadas para instituições de recuperação, 191 são presas em delito flagrante e apreendem-se 63 toneladas de droga, a maioria crack. Lá está, cracolândia. A viagem matinal por esse mundo proporciona uma visão inaudita. Vira-se uma esquina, tropeça-se no chão irregular e ouve-se um estrondo. É um autocarro a acelerar. Vai para onde? Ninguém sabe, lá em cima só diz reservado (ai quando o Marquês de Pombal souber). Poderia ser um bairro, sim, aqui em São Paulo há até um chamado Roland Garros, mas não é. Reservado é reservado, um autocarro vazio a caminho da garagem. Mas não é um autocarro qualquer, é da empresa Benfica, com o símbolo da águia em tamanho XXL e até o slogan em latim “e pluribus unum”. Scary movie.
Uma rápida conversa aqui, ali e chega-se à conclusão que o slogan está ligeiramente distorcido. O Benfica é que é uma nação? No Brasil, com o Oceano Atlântico a separar-nos, há uma empresa chamada Benfica. Vamos então de metro até Barueri, onde está a garagem principal. À nossa espera, Marcos Paulo Freitas Carreira, consultor de marketing e neto de um dos três fundadores portugueses. A história contada na primeira pessoa. “O meu avô Arnaldo de Figueiredo Freitas chegou ao Brasil na década de 50. Com ele, vieram também os seus irmãos Manuel e Filipe. Os três vinham da aldeia Alvarelhos, Carregal do Sal, no distrito de Viseu. Antes de se lançarem no sector de transportes de passageiros, onde encontrariam muito sucesso ao longo dos anos, tiveram a oportunidade de conhecer bem de perto a vida nas estradas brasileiras, a fazer entregas de doces de camião no estado de São Paulo.”
Pausa para ver uma frota de autocarros, mas somos teimosos e queremos saber mais. “Quando eles decidiram investir no sector de transporte de passageiros, há mais de 50 anos, criaram a empresa Benfica. A escolha desse nome está única e exclusivamente associada ao Sport Lisboa e Benfica, equipa do coração do meu avô e seus dois irmãos – um deles até foi juvenil do clube nos anos 40. Por coincidência, veja lá como as coisas são, o Benfica estava em São Paulo na altura em que a minha família registou a empresa, em São Caetano do Sul, São Paulo. Ao longo dos anos, a empresa não parou de crescer. Hoje em dia, o Grupo Benfica possui cinco empresas de transportes espalhadas pelo Brasil (TT Benfica, Benfica BBTT, Ralip, Noiva do Mar e Benfica Cargas e Logística), com garagens em diversas cidades brasileiras, uma frota de mais de 1500 veículos e cerca de 3500 empregados.”
Pausa (mais uma), para tocar nas fotografias antigas, maravilha. “O meu avô Arnaldo faleceu em 2000 mas deixou um legado enorme, através do seu filho, do seu neto e eu vou encarregar-me de espalhar a palavra por mais umas gerações.” E eles eram de ir a Portugal? “Nossa, sempre. Iam passar as férias de Verão e tinham de ver o Benfica. Eu apanhei esse ‘bicho’ e fui à Luz ver o Benfica-Arsenal para a Copa Eusébio em Agosto de 2012. Aqui no Brasil, somos todos da Portuguesa. Só pode, né?”.
Estamos quase quase a acabar, só mais uma pergunta: o autocarro do Benfica nunca deu problemas? (estamos a pensar em avarias, acidentes e assim, mas a resposta é surpreendente). “Olha, há uns anos, uma equipa de juniores do FC Porto veio cá a São Paulo para jogar um torneio e recusaram-se a entrar quando viram o autocarro do Benfica, à espera deles no aeroporto. Foi um caso até engraçado, claro que não ficámos desanimados, cada um tem o direito de andar onde quer. Aqui no Benfica, somos campeões do conforto.” Disto isto, voltamos à cracolândia. Lar, doce lar.
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