Adiós Benfica, por Quique Sanchez Flores
Hoje chegou a confirmação oficial do que há muito se previa. Por mais que ultimamente se tenha falado bastante nas maiores perspectivas de sucesso que a continuidade oferece em relação à mudança, a verdade é que a permanência de Quique Flores no comando do Benfica era já um produto com prazo de validade extinto.
Por muitas razões. Pela conjectura em que navega o clube vai para duas décadas, pelo percurso da equipa bastante abaixo das expectativas. Mas se, por exemplo, o despedimento de Fernando Santos me pareceu prematuro e contra-natura, assim não é com Quique. Não que o espanhol não tenha boas ideias ou não seja um bom profissional. Não que o Benfica não tenha evoluído no que diz respeito ao profissionalismo da estrutura para o futebol, ou na metodologia científica aplicada no processo de treino. Mas sim porque o espanhol revelou sempre um desconhecimento profundo do nosso futebol, que nunca demonstrou abertura para contrariar. A equipa manteve-se sem qualquer evolução desde o início da época, e essa é a maior crítica que se pode fazer a um treinador.
Na perspectiva de Rui Costa, acredito que a decisão não tenha sido fácil. Precisamente porque no final da sua primeira época como director desportivo foi obrigado a abdicar do 'seu' treinador. O homem que acreditava, aquando do estudo do seu perfil, ser o mais indicado para devolver o sucesso ao Benfica. Assim não foi. Obviamente que soluções de continuidade serão mais aconselháveis, mas não quando não são apresentadas perspectivas de evolução, ou no mínimo de continuação de bom trabalho. Não houve sequer uma evolução na ponta final da temporada, algo que acredito poderia fazer valer a continuidade do espanhol. Tal não aconteceu, e o desfecho foi o cenário mais óbvio.
O próximo treinador será muito provavelmente Jorge Jesus. No campo, é um treinador de top. Assim comprovam os discursos dos seus ex-jogadores, os resultados e as exibições das suas equipas. Mas para o sucesso muitas vezes tal facto não é suficiente. Em primeiro lugar, Jesus terá de evoluir a nível do discurso. É certo que o bom futebol vale mais do que um grande discurso (Quique Flores é disso um bom exemplo, inversamente), no sentido de aproximar os adeptos da equipa, mas principalmente na fase inicial será importante passar a mensagem. Depois a estrutura para o futebol terá que ser mais presente, mais solidária nos maus momentos, ao contrário do que aconteceu pontualmente com Quique nesta época.Esse é o segredo de uma equipa vencedora. Começa antes da entrada em campo, na preparação, na estrutura que suporta os craques, no profissionalismo, no método, na segurança que permite ao treinador centra-se apenas nas suas funções: treinar.
Até hoje muitas críticas têm sido feitas pelo facto de o Benfica contratar jogadores antes da escolha do treinador. Sou completamente contra essas opiniões. Elas podem ser feitas na eventualidade de não haver uma ideia de jogo definida para o clube. Se Rui Costa a tem, não sei. Mas as contratações, salvo ajustes pontuais ou uma ou duas exigências para potenciar o modelo, não devem ser feitas de acordo com os desejos do treinador. Devem sim, estar de acordo com o que se pretende para o clube, baseando-as em opiniões avalizadas a nível técnico-táctico por alguém com conhecimento suficiente de futebol (segundo se consta discutidas entre Quique e Rui Costa) e suportadas pelo departamente de prospecção.Apesar de tudo, algo continua a falhar no Benfica. A excessiva 'ligação' a certo tipo de empresários, e a, até agora, indisfarçável predilecção pelo mercado sul-americano em detrimento do português. Factos estranhos, especialmente quando se aproxima a lei do '6+5'. Ou talvez não tão estranhos assim...
A demissão egocêntrica
No mesmo dia em que se confirmou o mais do que anunciado divórcio entre o Benfica e Quique Flores, chegou a notícia de uma outra demissão. Não fossem os rumores que já corriam na imprensa, até se podia imaginar ser este um acto de solidariedade com o treinador espanhol, afinal, aposta forte desta direcção há um ano atrás. A realidade, porém, é que a demissão em bloco da direcção encarnada não passa de um mero golpe de estratégia política, tal como foi confirmado pelo próprio Manuel Vilarinho, poucas horas depois de ter aceite o pedido de Luis Filipe Vieira. A pergunta que fica, obviamente, é até que ponto os interesses dos sócios e do próprio clube foram esquecidos pelo agora demissionário Presidente nesta sua manobra pelo poder?
É óbvio que Outubro não é o ‘timing’ ideal para um processo eleitoral de um clube. Todos o reconhecem e não é a simples antecipação dessa data que merece contestação. O problema é que um processo eleitoral deve servir também para se debater o momento interno do clube, para se discutirem alternativas e escolher rumos. O que tenta fazer Vieira com esta tomada de decisão é, manifestamente, ir contra todos estes propósitos positivos que um processo eleitoral pode e deve ter. Se o objectivo era meramente conseguir uma data mais feliz para os interesses do clube, Vieira devia tê-lo decidido pelo menos 1 mês antes. Não foi isso que foi feito, e não será por acaso. Vieira optou por tentar trabalhar este desfecho fora das atenções de todos com um objectivo estratégico que visa retirar margem de manobra à oposição que é assim apanhada de surpresa e que seguramente terá menos margem de manobra para se constituir como alternativa ao actual Presidente. Não se trata aqui de fazer uma avaliação do mandato de Vieira à frente do clube da Luz, mas a verdade é que este é um golpe baixo de alguém que deveria, em primeiro lugar, zelar pelos interesses dos sócios e não limitar-se a definir a melhor estratégia para chegar ao poder. É uma constatação óbvia e nem é preciso falar da mais do que evidente tentativa de retirar Veiga da jogada. Curiosamente, quem mais poderá tirar partido deste acto egoísta é o próprio ex-empresário, restando saber se terá a astúcia para o fazer... Ler tudo»